COMISSÃO DO 11/9 DESCOBRE O ÓBVIO

A comissão parlamentar que investiga os ataques terroristas realizados contra os Estados Unidos em 11 de setembro de 2001, formada por congressistas republicanos e democratas, afirmou nesta quarta-feira que não encontrou nenhuma prova da ligação de Saddam Hussein com a Al Qaeda ou qualquer dos terroristas implicados naquele ataque. E mais: descobriu que Saddam recusou-se a colaborar com Osama bin Laden, líder da Al Qaeda, e não permitiu a abertura de um campo de treinamento desta organização no Iraque.

É mais uma complicação para o governo Bush, pois esta é a terceira justificativa para a invasão e ocupação do Iraque, iniciada no ano passado, que se revela uma mentira. A primeira foi a ameaça representada pelo Iraque, com suas armas químicas, biológicas e talvez até nucleares, que poderiam ser lançadas contra os EUA ou a Europa - e nunca se encontrou nenhuma dessas armas, apenas uma velha peça de obus contendo traços de sarin, uma peça de sucata do antigo arsenal químico de Saddam desmantelado na década de 90.

A segunda justificativa foi terminar o regime totalitário de Saddam, que prendia, matava, torturava indiscriminadamente qualquer um, sem acusação formal - prática que, agora se sabe, é mantida pelos EUA e seus aliados na coalisão, supostamente para acabar com a resistência iraquiana.

A terceira que sobrava era a suposta ligação entre Saddam Hussein e o inimigo número 1 dos EUA, Osama bin Laden e a Al Qaeda. Mais de dois terços da população estadunidense, segundo pesquisas recentes, acreditavam que o antigo líder iraquiano teve algum tipo de participação nos ataques terroristas de 11 de setembro.

O governo Bush fazia alarde disso, e o vice-presidente Dick Cheney afirmou que não lhe surpreendia o fato do povo dos EUA ligar Saddam e bin Laden. Agora, a comissão parlamentar (que tem a participação de congressistas do partido de Bush) afirma que não há nenhuma relação, e Saddam não pode de maneira alguma ser acusado por aqueles atentados. Esta afirmação da comissão é óbvia, e só surpreende a mal-informada população norte-americana. Saddam Hussein jamais poderia apoiar a causa de Osama bin Laden, porque aquele é a própria encarnação do que este mais abomina: um governo laico.

Bin Laden, através da Al Qaeda, luta por constituir aquilo que ele considera como uma "sociedade islâmica ideal": uma teocracia, formada por clérigos radicais, que aplicam rigorosamente aquilo que eles consideram ser a sharia, a lei islâmica. O modelo de uma tal "utopia islâmica" era o Afeganistão do Talibã, este sim apoiado entusiasticamente por Bin Laden desde a década de 80, quando ele lutava contra os soviéticos e ainda era um dos melhores amigos de Washington.

Saddam Hussein chegou ao poder em 1979, mesmo ano da Revolução Islâmica no Irã (que implantou uma teocracia um pouco mais branda que a do Talibã), e desde então foi fortemente apoiado pelos EUA, por ser um líder laico: Saddam é muçulmano, claro, mas não é um clérigo e não buscou implementar uma teocracia islâmica. Pelo contrário, combateu brutalmente a maioria xiita de seu país, inspirada pelos ideais iranianos, e iniciou uma guerra de 9 anos contra o Irã - e isso foi mais do que suficiente para fazer de Saddam um importante aliado dos EUA no Oriente Médio.

Como, então, alguém como Saddam poderia apoiar Osama bin Laden, a Al Qaeda ou o Talibã? O governo de Saddam no Iraque era exatamente um dos "infiés", representante da "infiltração de idéias ocidentais decadentes", combatidos por bin Laden: um governo laico, separado da religião. Só mesmo a completa falta de informação e a propaganda dos media pró-Bush nos EUA podem explicar um erro tão grosseiro, que é o de associar Saddam e Osama.

Pior que isso, só falar do "Eixo do Mal", colocando no mesmo saco países tão diferentes quanto o Afeganistão do Talibã, o Iraque de Saddam, a Coréia do Norte comunista e a Síria, como se todos eles se reunissem na calada da noite para conspirar contra as forças do bem, representadas pela democracia e seu mais fiel defensor, os Estados Unidos da América.

Carlo MOIANA Pravda.Ru Brasil

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