Aumenta o poder das milícias no Iraque!

A jornalista Mariam Fam, da Associated Press, dá-nos um testemunho fidedigno sobre um quotidiano de violência e insegurança, de aprofundamento de divisões étnicas... enfim, sobre o carácter nefasto e criminoso da invasão do Iraque comandada por George Bush!

O sol ainda mal tinha nascido sobre uma pequena aldeia sunita quando milícias armadas xiitas, vários vestidos de negro, lançaram um ataque, alegadamente para libertar reféns. Após várias horas de combates, morreram mais de 20 pessoas.

As versões acerca do que se passou no dia 27 de Outubro em Medayna, 45 milhas a noroeste de Bagdad, variam muito. Mas a violência sublinha uma perturbante e perigosa evolução no Iraque: o crescente papel e poder de milícias armadas e a sua contribuição para o aumento das tensões sectárias.

Insurgentes sunitas atacam abertamente xiitas. Muitos sunitas alegam que a sua comunidade esta a ser ameaçada por milícias armadas ligadas a partidos políticos xiitas.

A violência desencadeou-se quando soldados da milícia Exército de Mahdi, do religioso radical Muqtada al-Sadr, atacaram a povoação para libertar reféns que alegavam ali terem sido raptados por sunitas. Os moradores de Medayna clamam que não houve razão para o ataque.

Kannam Mesarhad, um líder tribal que vive em Medayna, acusa que elementos da milícia arrastaram à força para fora de casa um tio seu de 59 anos de idade, que o cegaram, que lhe bateram com uma espada na cabeça e que lhe deram um tiro entre os olhos.

"Executaram-no à frente dos seus filhos", disse Mesarhad. "De seguida incendiaram as casas". Enquanto gritavam insultos sectários aos sunitas.

Moradores de Medayna dizem que a milícia armada entrou pela povoação quando a maior parte das pessoas estavam a dormir e abriram fogo aleatoriamente, incendiando fazendas e casas, e atacando geradores eléctricos e reservatórios de água.

Depois do ataque inicial, segundo moradores, a milícia retirou mas regressou com elementos de forças especiais do Ministério do Interior, e em conjunto lançaram outro ataque.

No final dos combates, mais de 30 pessoas da aldeia tinham sido presas. A maioria das quais foram libertadas.

Hussein Elwan Khalaf, 66 anos, contou que três filhos seus estavam a dar comer a galinhas na sua quinta, quando tropas e a mílicia os arrastou para uma distância de 100 jardas e os fuzilou à frente dos seus olhos.

"Dois elementos da milícia agarraram-me, dizendo que me matavam se eu me movesse", contou. "Não pude fazer nada. E foi um polícia que os matou"

Relatou também que dois sobrinhos seus foram também fuzilados e um vizinho decapitado

Habitantes de Medayna dizem que a animosidade deve-se a assassinatos, roubos e raptos que têm acontecido na auto-estrada que liga a cidade de Nahrawan, onde vivem muitos elementos da milícia Exército de Mahdi, à província de Diyala, onde fica Medayna. E que a milícia os acusa pela autoria destes actos.

Abbas al-Rubaie, colaborador de al-Sadr, disse que alguns moradores estavam a abrigar terroristas que raptaram pessoas por dinheiro e que a milícia interveio a pedido das autoridades locais.

"A polícia não conseguia chegar ao local porque é fraca, e soube que alguns reféns estavam prisioneiros nesta aldeia", disse. "É um dever religioso salvar uma vida".

Afirmou que os soldados de Mahdi encontraram resistência de militantes na povoação, que acusa de terem colocado explosivos nas estradas de acesso ao local. E que foram 19 elementos da milícias e 5 da polícia.

Negou que o ataque tenha tido uma motivação sectária ou que milicianos tenham morto pessoas sem serem provocados em Medayna.

O Vice-Ministro do Interior, Major-General Ali Ghalib disse ainda que insurgentes estavam escondidos em Medayna e que armaram uma embuscada à forças de segurança. E negou que as forças do seu ministério tenham violado alguma lei.

O governador da província de Diyala, Raad al Timini, disse que Medayna é um "ponto problemático" porque alberga "elementos que cometem actos de violência", nomeadamente ladrões.

"Dyala é uma vasta província e há áreas fora do controlo do governo", disse. "Além disso os efectivos policiais que temos em Diyala são muitos poucos"

Al-Timini disse que há 5000 polícias na província, menos de metade do número necessário. Disse também ter pedido reforços ao Ministério do Interior mas que recebeu apenas promessas.

O vice-governador de Diyala, Ouf Rahoumi - sunita e membro do Partido Islâmico Iraquiano - afirmou que a polícia está desmoralizada. "Estão estafados e psicologicamente exaustos. Muitos deles foram mortos ou feridos. precisam de reforços", disse.

Mas Rahoumi disse que foi uma surpresa para as autoridades locais ver cerca de 200 homens da mílicia Mahdi atacarem Madayna e que nunca solicitaram a sua intervenção. "queimaram casas e mataram pessoas, por isso os moradores reagiram defendendo-se a si próprios", disse.

Afirmou ainda que o exército Mahdi é apoiado por elementos do governo, e que porque o exército e a polícia são compostos essencialmente por xiitas reprimem os sunitas.

"Isto é o início de uma guerra sectária", diz Rahoumi. "A situação chegou a este ponto porque o governo central em Bagdad está a fechar os olhos em relação às milícias"

Ghalib alega que a composição das forças de segurança espelha a composição da população iraquiana. Os xiitas constituem 60% dos 27 milhões de habitantes do Iraque.

"No ministério do Interior somos veementemente contra que qualquer milícia desempenhe funções de segurança", diz Ghalib.

Mas estas garantias não convencem os habitantes locais como Mesarhad.

"As milícias têm neste momento mais poder que a polícia", disse. "Se houvesse um governo isto não aconteceria. Agora é como uma guerra de gangues. A conversa de que há um governo e um parlamento é mera propaganda, apenas para a televisão"

Traduzido por Luís Carvalho

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