Política penal para Portugal

A Associação Contra a Exclusão pelo Desenvolvimento (ACED) está de acordo com a necessidade geral de comparar as realidades prisionais em Portugal com as outras realidades europeias. Ao fazê-lo, não fica satisfeita com a nossa situação (como ninguém pode ficar (cf. inquéritos da Provedoria de Justiça ou comissão Freitas do Amaral) nem com a situação geral na Europa, onde o número de presos e os riscos de histeria securitária, influenciados pelo ambiente global belicoso, não param de aumentar.

Entendemos, portanto, haver necessidade de um grande debate sobre direitos humanos, políticas criminais e políticas penais como desígnio de moralização das relações sociais na Europa, se bem sucedido, fundamento de novas estratégias de desenvolvimento, por exemplo, relativamente à dignificação da circulação e dos espaços urbanos contra os guetos, à dignificação do trabalho e do emprego contra a fraude e a escravatura, ao acolhimento digno de imigrantes contra a exploração, à valorização da cultura cosmopolita do mérito absoluto contra o oportunismo alegadamente de competição.

O debate de que falamos não é um debate menor: é um debate sobre os fundamentos da nossa civilização ocidental, obviamente em crise. Um modo de trabalhar para evitar um retrocesso de valores duramente adquiridos pela experiência histórica e pela coragem modernas, porque o risco de subversão da democracia é real. Tanto mais real quanto os democratas se recusarem a abordar e fortalecer as razões, teóricas, doutrinárias e práticas, que os têm unido. Bem sabemos que não parece um debate económico, mas a verdade é que Portugal se encontra num impasse nesse domínio precisamente depois do anúncio – pela boca de um primeiro-ministro demissionário – de que se estava a viver um pântano político. Quer dizer: há boas razões (também históricas) para deduzir que, para o bem e para o mal, a qualidade moral das relações sociais dominantes determina a qualidade da vida económica. Ora, o debate que urge, e que bem pode ser levado a cabo em torno das questões criminais, é o de saber como foi possível Portugal deixar-se envolver no seu próprio atoleiro e como sair dele e, ao mesmo tempo, ajudar o mundo ocidental a não cair na mesma armadilha. Portugal é o elo fraco da cadeia ocidental e, por isso, é também uma experiência laboratorial do que está a acontecer ao mundo moderno. Saberemos ser boas cobaias? Ou seremos cobaias resignadas? Eis a questão.

A curto prazo, todavia, as coisas, ao contrário do que se quer fazer querer, são radicalmente simples. É preciso fazer um bom diagnóstico – que, ao contrário do que se costuma dizer, é sistemática e convenientemente evitado – e tirar daí as ilações práticas mais simples. Conclusão geral do nosso diagnóstico: o sistema prisional português é um dos centros mais activos da criminalidade, protegido pela incúria do Estado, que não sendo pessoa de bem (neste campo como noutros), se mostra indiferente e até tenta tirar proveito da situação (por exemplo, elegendo o tema para campanhas eleitorais e declarações políticas mentirosas, intimidatórias, estigmatizantes e populistas).

O que fazer? 1. Evitar processos políticos elaborados, como mostra a história da comissão Freitas do Amaral. 2. Entender a crise prisional como parte integrante do combate ao crime organizado e à corrupção. 3. Fazer cumprir a lei supostamente em vigor, para que deixe de ser uma mera sugestão. 4. Reduzir drástica e rapidamente o número de detidos para um terço dos actuais, através da revisão das leis da junção de processos e dos cúmulos jurídicos, da qualificação do exercício e da dignidade dos Tribunais de Execução de Penas e de outros meios. 5. Privilegiar fortemente os regimes abertos prescrito na lei. 6. Utilizar o dinheiro assim libertado para investir em prevenção criminal, nomeadamente o investimento ao combate ao crime dito de colarinho branco e para desenvolver meios de estudo e diagnóstico de situações de risco social.

Estas propostas simples mostram que o que falta é vontade política de rentabilizar os recursos disponibilizados pelos contribuintes pagantes para fazer justiça social, em particular não desperdiçar dinheiro em serviços prisionais que servem para proteger áreas demarcadas para o crime – nas próprias prisões – e podendo usá-lo, em vez disso, em perseguir os oportunistas e trânsfugas de maior calibre. Os políticos encarregues destas áreas nos últimos anos, sabemo-lo por experiência própria, têm preferido fingir ignorar a questão. Há que lhes perguntar: de que têm medo? Com que estão comprometidos que os impede de cumprirem com o seu dever de fazer respeitar a lei?

Estas propostas também mostram como a economia, no seu próprio fundamento, depende da ética e da moral sociais.

A Direcção

ACED

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