Rede Lusófona dos Direitos Humanos

A Rede Lusófona de Direitos Humanos - um processo em gestação cujo embrião é representado pela parceria entre a Rede Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte (REDH-RN), no Nordeste do Brasil, e a Comissão Nacional para os Direitos Humanos e a Cidadania (CNDHC) de Cabo Verde, mas ao qual já aderiram diversas entidades de outros países de língua portuguesa, entre elas a Liga Moçambicana dos Direitos Humanos (LDH), a ONG de formação para a cidadania Humana Global (Coimbra, Portugal) e a Fundação Mário Soares (Lisboa, Portugal) - está prestes a dar mais um passo concreto em direção à sua efetivação.

De fato, a CNDHC de Cabo Verde e a REDH-RN do Nordeste do Brasil realizarão em setembro e outubro um intercâmbio de pessoal da área de comunicação - concretamente, o Presidente da Associação dos Jornalistas Cabo-Verdianos, Paulo Lima, e o editor-chefe de Tecido Social, Antonino Condorelli - finalizado à construção do Plano de Comunicação da Comissão Nacional para os Direitos Humanos e a Cidadania de Cabo Verde, na elaboração do qual a REDH-RN dará uma relevante contribuição fornecendo sua experiência e seus conhecimentos. Deste jeito, a comunicação para os Direitos Humanos, um dos eixos norteadores da Rede potiguar e da Rede Lusófona que deriva da lógica da primeira, vai virar também uma das prioridades da ação da CNDHC para socializar conhecimentos e informações sobre cidadania e sobre como exercer esta última ativamente em todas as ilhas e todos os municípios do arquipélago cabo-verdiano.

O intercâmbio entre a CNDHC e a REDH-RN começará esta semana com a vinda de Paulo Lima a Natal, capital do Estado do Rio Grande do Norte, no Nordeste do Brasil, para conhecer as experiências na área de comunicação do Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP), a entidade que coordena o processo de construção da REDH-RN. O Presidente da Associação dos Jornalistas Cabo-Verdianos estará na capital potiguar de 3 a 9 de setembro, enquanto o editor-chefe de Tecido Social viajará a Cabo Verde na segunda metade de outubro.

Durante a semana que passará em Natal, Paulo Lima conhecerá a política de comunicação da REDH-RN, que ele próprio com sua experiência contribuirá a ampliar a fortalecer, e o sistema de comunicação que deriva desta política, ou seja, o conjunto de instrumentais digitais (como a Dhnet - Rede Direitos Humanos e Cultura, o Tecido Social, os CD-ROMs de memória histórica, a página em português de Arcoiris Tv fruto da parceria com a REDH-RN para colocar no ar parte do acervo de vídeos do CDHMP, a Rádio Dhnet, etc.), impressos (como as edições temáticas impressas de Tecido Social, os cartazes, etc.), em áudio (como o CD com spots e informações sobre Direitos Humanos para as rádios comunitárias produzido em parceria com a Rede de Mulheres no Rádio) e em vídeo (o acervo da Videoteca Popular do CDHMP, que possui mais de 500 títulos sobre temáticas ligadas aos Direitos Humanos e à cidadania) que derivam desta política e contribuem a efetivá-la.

Principalmente, a REDH-RN pretende fazer entender e transmitir ao Presidente da Associação dos Jornalistas Cabo-Verdianos o carácter glocal (termo que representa a fusão dos conceitos de global e local) do seu sistema de comunicação. Ou seja, um sistema concebido para projetar para o planeta as realidades de Direitos Humanos e as atividades dos grupos sociais organizados de todas as comunidades e todos os municípios do pequeno, paupérrimo e semi-desconhecido Estado brasileiro do Rio Grande do Norte e, ao mesmo tempo, socializar com estas últimas conhecimentos, informações e debates de porte global (tais como os princípios da Conferência Mundial de Direitos Humanos de Viena de 1993, os Sistemas Globais de Proteção aos Direitos Humanos, os Objetivos do Milênio das Nações Unidas, as metas previstas pelas grandes conferências mundiais sobre direitos temáticos como Durban para a Igualdade Racial, Rio de Janeiro e Kyoto para o meio-ambiente, Beijing para os direitos da mulher, etc., assim como o espírito de rede global, de troca permanente de informações e experiências que vêem realizando os movimentos sociais do planeta desde Seattle para frente, passando pelos Fóruns Sociais Mundiais) num processo contínuo e incessante de osmose entre local e global.

Mas a passagem de Paulo Lima por Natal será também uma ocasião para discutir o desenvolvimento da Rede Cabo Verde de Direitos Humanos On line, realizada pela REDH-RN através da sua plataforma digital, a Dhnet - Rede Direitos Humanos e Cultura, como parte da parceria com a CNDHC de Cabo Verde, embrião da Rede Lusófona. A equipe técnica da Dhnet está terminando de desenhar o personagem que simbolizará a Rede Cabo Verde, a criança crioula Bianet (inspirada no indiozinho Curuminet da REDH-RN) e Paulo Lima trará a Natal novo material para implementar a página de conteúdos.

A parceria entre a CNDHC e a REDH-RN na área de comunicação vai ter outro importante desdobramento. Nestes dias, a Rede potiguar está terminando de criar um servidor de e-mails próprio, que agilizará o gerenciamento da lista de distribuição de Tecido Social (embora a maior parte desta última ficará no servidor atual, a Rits - Rede de Informações para o Terceiro Setor). O novo servidor vai ser disponibilizado para a criação de um jornal eletrônico da CNDHC, remetido a endereços de Cabo Verde e outros países de língua portuguesa. A produção dos conteúdos deste último ficará por conta da Comissão Nacional para os Direitos Humanos e a Cidadania de Cabo Verde, enquanto de sua distribuição eletrônica se encarregará a REDH-RN através da sua infra-estrutura. Se trata de uma novidade que promete ampliar enormemente o alcance tanto global quanto local das ações de comunicação da CNDHC, nos moldes da experiência de Tecido Social.

Além das discussões para elaborar o Plano de Comunicação da CNDHC e implementar a Rede Cabo Verde de Direitos Humanos On line, a semana do Presidente da Associação dos Jornalistas Cabo-Verdianos em Natal será animada por vários eventos e por aparições na mídia local. Entre os eventos previstos, uma intervenção no Conselho Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte para apresentar a experiência nesta área da CNDHC em Cabo Verde; um encontro com estudantes de jornalismo e de outros cursos, entre os quais cabo-verdianos e outros africanos residentes em Natal, no Campus da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN); um encontro com representantes da Rede de Mulheres no Rádio; uma intervenção na Câmara Municipal de Natal e outra na Assembléia Legislativa do Estado que serão gravadas e transmitidas ao vivo, respectivamente, pela Tv Câmara e a Tv Assembléia (canais locais de tv a cabo). Paulo Lima será também entrevistado pelo jornal local Diário de Natal e pelo suplemento TN Escola do diário Tribuna do Norte. Além disso, a equipe do CDHMP gravará uma intervenção do jornalista cabo-verdiano sobre o surgimento e as atividades da CNDHC e o vídeo será utilizado dentro de um módulo de um Curso de Agentes da Cidadania em fase de elaboração.

Publicamos a seguir uma entrevista por e-mail a Paulo Lima realizada pelo editor-chefe de Tecido Social, Antonino Condorelli, na véspera da viagem do Presidente da Associação dos Jornalistas Cabo-Verdianos ao Rio Grande do Norte, início prático deste intercâmbio inter-atlântico de comunicadores de Direitos Humanos.

ENTREVISTA

Paulo Jorge Lima*

"A meta do Plano de Comunicação que a CNDHC vai elaborar bebendo da fonte da experiência da REDH-RN será tornar cada cidadão cabo-verdiano um promotor de Direitos Humanos"

Por Antonino Condorelli

Tecido Social: Qual é a situação geral da informação em Cabo Verde? Existem liberdade e pluralismo efetivos? Há espaço para as reivindicações e as temáticas levantadas pelos movimentos populares e a sociedade civil organizada?

Paulo Lima: A problemática dos Direitos Humanos sempre foi uma constante no Cabo Verde independente e prova disso são os textos constitucionais do país. Em termos de liberdades do exercício de expressão e imprensa, estes estão salvaguardadas na Constituição da República. Contudo, é no dia-a-dia que podemos constatar que assuntos relacionados com os Direitos Humanos nem sempre estão nas agendas das redacções salvo alguns casos de denúncias pontuais.

Tecido Social: Não existe, portanto, uma política de comunicação cabo-verdiana com relação aos Direitos Humanos?

Paulo Lima: A meu ver não existe uma verdadeira coordenação no sentido das questões dos Direitos Humanos e da cidadania estarem na imprensa. É justamente por isso que a CNDHC pretende dotar-se de uma estratégia de comunicação. Esse deficit também deve-se a uma falta de sensibilidade nos próprios órgãos. Portanto, aí também teremos que definir estratégias claras. Um exemplo poderá ser a formação de jornalistas em questões de Direitos Humanos.

Tecido Social: O que é o Plano de Comunicação que a Comissão Nacional para os Direitos Humanos e a Cidadania (CNDHC) de Cabo Verde vai elaborar, contando também com a contribuição da Rede Estadual de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte (REDH-RN)?

Paulo Lima: O Plano de Comunicação da CNDHC pretende ser um instrumento que vai colocar no cidadão a responsabilidade de discutir e promover aspectos dos direitos humanos e da cidadania. Será a ponte entre a CNDHC e o cidadão fazendo recurso a todas as formas possíveis de comunicação. A meu ver, deve ter uma componente mediática mas não deve descurar o lado presencial.

Tecido Social: Na sua opinião, que possibilidades abre o Plano de Comunicação da CNDHC para as entidades da sociedade civil organizada de Cabo Verde?

Paulo Lima: Transformar cada cidadão num potencial promotor dos Direitos Humanos deve ser a nossa meta em termos de comunicação. Cidadãos conscientes dos seus direitos e deveres para com a sua comunidade é a certeza de uma sociedade mais justa e equitativa. Pensamos que o Plano de Comunicação será o instrumento que irá fazer fluir o manancial de informação que detemos, mas não informação pela informação mas para mudança de comportamentos. Deve ser uma comunicação de mão dupla pois como sempre dizemos uma das metas é tornar cada cidadão num promotor de Direitos Humanos.

Tecido Social: O que estimulou a CNDHC a promover um intercâmbio com o Rio Grande do Norte para a elaboração do seu Plano de Comunicação? Em que a experiência da REDH-RN na área de comunicação, que tem esta última entre seus eixos norteadores e a concebe numa perspectiva "glocal" que vai das comunidades de base potiguares ao planeta na sua totalidade e vice-versa, vai poder contribuir para a construção do Plano?

Paulo Lima: Consideramos importante esta parceria com a REDH-RN, que já possui todo um historial no processo comunicacional na vertente dos Direitos Humanos. Pretendemos literalmente beber dessa experiência que funciona, e com as devidas adaptações iniciar um processo duradoiro e a prazo com resultados concretos nesta caminhada em prol da promoção dos Direitos Humanos. O trabalho que é feito pela REDH-RN é visto por nós como um exemplo a seguir. Estamos interessados em reafirmar a parceria e em termos de comunicação temos muito a ganhar com a proximidade geográfica e a língua comum. O plano de comunicação que idealizamos deve ser transversal e atingir vários públicos alvos. Não esqueçamos que Cabo Verde tem uma forte diáspora e essa componente não poderá ficar de fora.

Tecido Social: De fato, Cabo Verde tem aproximadamente 450.000 habitantes, disseminados ao longo de 9 ilhas (de 10 que compõem o arquipélago). A grande maioria da população cabo-verdiana, cerca de um milhão e 500 mil pessoas, vive fora do país. Você afirmou que CNDHC, através de seu Plano de Comunicação, pretende chegar às comunidades cabo-verdianas espalhadas pelo mundo. Por outro lado, vocês pretendem também trazer para dentro do arquipélago as informações sobre as problemáticas de Direitos Humanos vivenciadas pelos milhares de cabo-verdianos residentes no exterior?

Paulo Lima: Achamos que sim. Não basta falarmos de nós. Devemos ser capazes de trazer as experiências boas que encontrarmos noutros locais como forma de mudança de comportamentos dos nossos cidadãos em relação à problemática dos Direitos Humanos.

Tecido Social: Acha viável, a longo prazo, a possibilidade de uma Central Lusófona de Comunicação sobre Direitos Humanos, orgânica e descentralizada, que abranja todas as formas de comunicação existentes (a radiofónica, a audiovisual, a impressa e a digital) e seja veículo de expressão de todas as forças vivas dos países de língua portuguesa que integram a Rede Lusófona de Direitos Humanos, começando pela CNDHC e a REDH-RN?

Paulo Lima: Cada uma das nossas organizações tem o seu historial e a sua experiência. O sucesso da nossa rede vai depender da nossa capacidade de trocar informações a nível da Comunidade de Países de Língua Portuguesa. Neste particular, o recurso às tecnologias de comunicação e informação será o meio para ultrapassar as barreiras geográficas. A CNDHC na pessoa da sua presidente, Vera Duarte, tem exprimido em diversas ocasiões a importância da Rede Lusófona de Direitos Humanos, e penso que a comunicação deverá ter um papel importante como veículo de transmissão das ideias e projectos que quisermos implementar.

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