Patrono dos sertões

Bem antes dos paulistas se apossarem das várias minas que nestas terras floresciam, inúmeras expedições vindas do norte, desde 1554 - o povoamento inicial foi no litoral baiano - e do leste já constatavam as riquezas que aqui existiam. Assistido nisso, Fernão Dias Paes Leme veio do sul em busca direta pelas riquezas do norte, antevendo que mais ao alto encontraria a serra reluzente do sabarabuçu, a terra das esmeraldas. Sem saber, Fernão Dias pisou nelas, ao passar pela região Central de Minas, onde hoje está a cidade de Nova Era, outrora São José da Lagoa, que abriga a maior jazida de esmeraldas de Minas Gerais.

Em sua busca quase insana pelas esmeraldas, Fernão Dias descobriu um Estado, com suas picadas abrindo estradas, sua comitiva fundando vilas e cidades, suas roças gerando fazendas e sua lenda trazendo para essas terras aventureiros, garimpeiros, mascates e toda horda de homens e negociantes. Era o início de tudo.

Brasileiro nato, de família abastada, Fernão Dias merece uma atenção especial como uma página de glória em nossa caduca memória nacional.

Do alto de seus 66 anos, que naquela época lhe pesavam bem mais que se comparado aos dias de hoje, o velho comandante saiu do conforto de sua casa para fazer história, dar um novo ritmo ao povoamento do Brasil, iniciar um novo clico econômico, cultural e social naquele que era um amontoado de vastidão, misérias e grandezas. Se não bastassem apenas isso, deixou enferma, em casa, a esposa, Maria Garcia Rodrigues Betim, bem mais jovem que ele. Tudo, feito às suas custas, vendendo os ouros e as esmeraldas da família, que teve o dia 21 de junho de 1674 como o marco inicial dessa epopéia.

Com mais de seiscentos homens, entre brancos - a minoria - mamelucos e muitos índios, a bandeira brasileira de Fernão Dias veio do sul varrendo os sertões de Minas, transpondo a Serra da Mantiqueira na região de Passa Quatro (uma referência a quantas vezes se cruzam os rios) e alcançando o Campo das Vertentes. Compunha a comitiva, seu filho Garcia Rodrigues Pais, que depois desbravaria um segundo caminho em direção ao mar, os genros, Manuel da Borba Gato e Francisco Pais de Oliveira Horta, e o filho bastardo, José Dias, que o final da história lhe confere outra distinção. Como guia espiritual, acompanhava a bandeira o padre João Dias Leite, exercendo a profissão de fé daqueles homens movidos por sonhos e esperança. Era, verdadeiramente, uma grande saga brasileira.

Muito tem-se escrito sobre sua vida e seu legado e muito ainda há por se escrever, ao se aprofundar na figura humana desse brasileiro que trocou o conforto de seus aposentos para desbravar sertões; a convivência nababesca dos grandes salões para enfrentar feras na noite escura da alma humana; trocou o certo pelo que ainda inexistia. O que o moveu não foi apenas o sonho da riqueza pueril, afinal, o tempo já lhe havia confiscado a cobiça pelos valores passageiros e, por sua vida, já o tinha em sua maior plenitude.

Fica, para todos nós, a inexplicável justificativa da paixão da conquista, a entrega da descoberta, a paixão que move todos os grandes feitos e as grandes obras da Humanidade, essa paixão que povoa a alma e os sonhos dos homens maiores.

Petrônio Souza Gonçalves é jornalista e escritor

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