Opinião: Justiça de resultados

A condenação, nos EUA, do casal Hernandes, da Igreja Renascer em Cristo enseja a comparação entre a ação da Justiça daquele país e a do Brasil. Presa em janeiro, ao desembarcar em Miami com dólares não declarados, a dupla, mediante fiança de US$250 mil, foi posta em liberdade vigiada. A acusação de contrabando de divisas e a prática de ofensa federal ao mentir sobre o dinheiro poderiam render ao casal até dez anos de prisão.

 Para escapar de enfrentar o júri e garantir uma pena muito menor, os acusados aceitaram um acordo com a promotoria, confessaram os crimes e foram julgados em 17 de agosto, condenados a 140 dias de prisão, metade domiciliar, metade na penitenciária, multa de US$30 mil cada, e dois anos de liberdade condicional, sem poderem sair dos EUA.

Entre o flagrante e o julgamento houve apenas uma audiência; tudo liquidado em meros sete meses. Justiça pragmática, de resultados, econômica e célere. O episódio ilustra o contraste entre um Estado que funciona e o brasileiro, apático. Por aqui, acusados de crimes muito piores têm o tempo, se não a eternidade, por aliado. Coberto de razão, o lúcido ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa critica o foro privilegiado de autoridades e queixa-se da complexidade dos julgamentos. Nem o Supremo nem o STJ têm por escopo instruir processos criminais.

Leis são feitas, em tese, para garantir direitos e obrigações, mas falham nestes quesitos quando pecam pelo excesso de cautela, que se traduz na infinidade de recursos e na quase impossibilidade de se manter réus manter presos, antes da sentença final. Os exemplos, fartos, estão aí, gente condenada por crimes gravíssimos recorrendo em liberdade. Nossa legislação é tão zelosa dos direitos dos réus, tanto na área cível quanto na criminal, que lhes garante uma incolumidade que representa a negação da proteção do Estado às partes prejudicadas, de tal forma que ingressar com uma ação judicial é uma iniciativa cara e de alto risco, não pela eventualidade de se perder a causa, o que é do jogo, mas pela literal perenização da demanda.

Com o recente acidente em Congonhas, noticiaram-se as dificuldades enfrentadas pelos parentes das vítimas de desastres aéreos anteriores – e novamente aqui, cabe o cotejo com a justiça norte-americana – nas ações movidas contra as empresas aéreas na Justiça brasileira, que tem, hoje, 35 milhões de ações em tramitação. Foram revelados casos de famílias com processos iniciados há décadas, uma delas aguarda sentença de indenização por um acidente ocorrido em 1962 enquanto, nos EUA, o júri decide rápido. No Rio Grande do Norte ainda tramita um processo de 1938...

Que legislação é essa que deixa à míngua pessoas que perderam os responsáveis por seu sustento, enquanto poder público e empresas, mesmo sabendo-se culpados, persistem no litígio, em vez de fazer acordos? E que Constituição é essa que, mesmo com o mecanismo da revisão criminal, e prevendo a indenização por erro judiciário, não impede que inocentes sejam presos e, soltos, alguns após décadas, ainda tenham que processar a União e, vencendo, recebam um título chamado precatório, mera promessa de pagamento com milhares de pessoas na fila?

Nossas autoridades são nobres demais para serem julgadas pela primeira instância, embora nos EUA não haja foro privilegiado nem mesmo para o presidente. Existe a imunidade diplomática, definida pela convenção de Viena, e só. Recentemente, o deputado democrata William Jefferson foi indiciado no tribunal de Alexandria, subúrbio de Washington, por corrupção, extorsão, suborno, obstrução da Justiça e lavagem de dinheiro.

O retumbante sucesso dos que, cada vez mais, optam por operar no mercado da corrupção está intimamente ligado à falta de pragmatismo de nossa legislação.

Luiz Leitão

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