Brasil: Análise etnográfica

Sustentando-se numa intensa experiência etnográfica, que decorreu entre 1997 e 2005, na costa atlântica brasileira, o livro “Terra Calada”, da antropóloga Susana de Matos Viegas, trata dos afectos, das tensões familiares, das fantasias e conciliações entre homens e mulheres, das vivências do espaço e das estéticas de acção dos Tupinambá de Olivença, oriundos da grande família Tupi, que nos primeiros séculos da colonização foram descritos pelos cronistas portugueses.

Ao logo deste trabalho de campo, a investigadora foi descobrindo marcas profundas de uma herança ameríndia, revelada nas intimidades vividas das frágeis casas de sopapo, do alimentar das crianças, dos locais de habitação sinalizados pelos pés de frutas, das trilhas pisadas ou esquecidas pelos pés na floresta, da fabricação da farinha, das noites de música e cachaça, da limpeza dos corpos cansados nos córregos, das jovens que circulam entre a ‘roça’ e a cidade.

Há quatro séculos que os índios Tupi se têm confrontado com sucessivos projectos civilizatórios – sejam coloniais, nacionalistas ou missionários. Recorrendo a múltiplas estratégias para enquadrar comparativamente a experiência vivida pelos Tupi, este estudo mostra, por meio de análise etnográfica e histórica, que há sete décadas que estes índios vivem nos intervalos das áreas residenciais que foram, entretanto, surgindo, ficando cada vez mais circunscritos por formas de ocupação da terra que ameaçam directamente a sustentabilidade dos seus modos de vida.

“Terra Calada” aborda uma população indígena da costa atlântica brasileira num diálogo amplo entre a etnografia, a comparação antropológica regional e a história, propondo uma análise que entrelaça os campos brasileiros da antropologia americanista e da antropologia das sociedades indígenas.

Susana de Matos Viegas, pesquisadora e professora do Programa de Pós-graduação do ICS, é doutorada em Antropologia Social e Cultural e presidente da Associação Portuguesa de Antropologia. Já publicou várias obras em Portugal e no estrangeiro sobre identidade, pessoa, parentesco e território.