No Brasil, empresa de senador é acusada de fraudar licitação de R$ 300 milhões na Petrobrás

Por ANTONIO CARLOS LACERDA

PRAVDA.RU

No Brasil, empresa de senador é acusada de fraudar licitação de R$ 300 milhões na Petrobrás. 15357.jpegRIO DE JANEIRO/SÃO PAULO/BRASILIA/BRASIL - A Manchester Serviços Ltda, empresa da qual o senador Eunício Oliveira é dono, soube com antecedência, de dentro da Petrobrás, a maior empresa estatal brasileira, quais eram seus concorrentes e os procurou em busca de acordo para vencer disputa por um contrato de consultoria e gestão empresarial. A denúncia foi feita inicialmente pelo Estadão.

 

Documentos e imagens obtidos pelo Estado revelam que a Petrobrás e uma empresa do senador e tesoureiro do PMDB, Eunício Oliveira, fraudaram este ano uma licitação de R$ 300 milhões na bacia de Campos, região de exploração do pré-sal no Rio de Janeiro, Sudeste do Brasil.

 

A Manchester Serviços Ltda, da qual Eunício Oliveira é dono, soube com antecedência, de dentro da Petrobrás, da relação de seus concorrentes na disputa por um contrato na área de consultorias e gestão empresarial. De posse dessas informações, procurou empresas para fazer acordo e ganhar o contrato.

 

Houve reuniões entre concorrentes durante o mês de março, inclusive no dia anterior à abertura das propostas. O Estadão teve acesso ao processo de licitação e a detalhes da manobra por parte da Manchester para sagrar-se vencedora no convite n.º 0903283118.

 

Às 18h34 de 29 de abril, a Petrobrás divulgou internamente o relatório em que classifica a oferta da Manchester em primeiro lugar na concorrência com preço R$ 64 milhões maior que a proposta de outra empresa.

 

O contrato, ainda não assinado, será de dois anos, prorrogáveis por mais dois. Sete empresas convidadas pela Petrobrás participaram da disputa, a maioria sem estrutura para a empreitada. Os convites e o processo de licitação são eletrônicos e as empresas não deveriam saber com quem estavam disputando.

 

Em 30 de março, um dia antes da abertura das propostas, o diretor comercial da Manchester, José Wilson de Lima, reuniu-se duas vezes, por mais de três horas, na cidade de São Paulo, sudeste do Brasil, com uma das empresas convidadas pela Petrobrás, a Seebla Engenharia, segundo registros de segurança do prédio onde funciona essa empresa.

 

Uma foto de José Wilson de Lima ficou registrada nos arquivos do condomínio. O objetivo da visita era exigir da Seebla que aceitasse um acordo.

 

A Seebla confirmou o encontro e, questionada, disse que isso também ocorrera em dias anteriores. A empresa afirmou que não fez acerto. No dia seguinte à reunião, ofereceu na licitação o preço de R$ 235 milhões, bem abaixo dos R$ 299 milhões apresentados pela empresa do senador Eunício Oliveira. Mesmo assim, foi desclassificada pela Petrobrás.

 

Um diretor de outra empresa envolvida, que pediu para não ser identificado, por questão de segurança, contou que diretores da Manchester usaram o nome de Eunício Oliveira para oferecer R$ 6 milhões em dinheiro vivo em troca de uma "cobertura" na licitação - ou seja apresentar proposta com valor que serve apenas para simular concorrência e ajudar uma parceira a ganhar a licitação. "Tentaram nos comprar", disse o diretor da empresa. Em troca, a Manchester faria o mesmo em outra licitação.

 

Por sua vez, a Petrobrás alegou que disputa é realizada por meio eletrônico e diz desconhecer reuniões entre concorrentes. "A Petrobrás desconhece essa informação. A licitação foi realizada em meio eletrônico, com entrega das propostas por computador. A abertura das propostas também foi eletrônica", disse a estatal.

 

Procurado para falar sobre as acusações, o senador Eunício Oliveira mais uma vez optou pelo silêncio. Dono de 50% da Manchester, ele disse que está afastado das decisões da empresa. Eunício Oliveira é sócio de outras empresas contratadas pelo governo.

 

Esse contrato com a Petrobrás será um dos maiores - senão o maior - já firmado por ele. Quando o Estadão mostrou que o senador ganhou da Petrobrás pelo menos R$ 57 milhões sem licitação, Eunício Oliveira também não quis se manifestar.

 

A Petrobrás alegou que desclassificou a Seebla Engenharia, que ofertou o menor preço, porque foram verificadas "inconsistências na proposta da empresa, entre elas a alíquota de determinado imposto em porcentual menor do que o que deveria ser praticado e a omissão dos porcentuais de determinados encargos sociais exigidos". "Essas inconsistências tornaram a proposta inexequível", disse. "A licitação do convite 0903283118 foi do tipo melhor preço e não menor preço."

 

A direção da Seebla contestou as alegações da Petrobrás. Disse que sua proposta é adequada. "Os custos apresentados pela Seebla refletem com segurança a realidade do empreendimento aos mais altos interesses dessa companhia", disse, em defesa entregue à estatal. Um dos pontos de discordância é o valor do Imposto Sobre Serviço (ISS), o que gerou a abertura de um processo em Macaé, no Estado do Rio de Janeiro, sede da Petrobrás na Bacia de Campos.

 

 

O objeto do processo de licitação manipulado e fraudado pela empresa do senador Eunício de Oliveira é vinculado ao diretor de Serviços da Petrobrás, Renato Duque, apadrinhado do ex-ministro e do deputado cassado José Dirceu, DO PT. Dirceu e Eunício são amigos de longa data e trabalharam juntos no governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando foram ministros.

 

Duque é responsável pelas áreas de engenharia e de tecnologia da informação, entre outras. A contratação da Manchester Serviços Ltda. também passa pelas mãos do gerente-geral da Petrobrás na Bacia de Campos, José Airton de Lacerda. Outros três funcionários aparecem no processo de licitação: Eduardo Riskalla Pereira, Bruno Avelar Rangel e Rafael dos Santos.

 

O PMDB indicou o diretor da área Internacional, Jorge Zelada, e o de Abastecimento, Paulo Roberto Costa, no governo Lula, e os manteve com Dilma Rousseff.

 

A empresa fornece cerca de mil funcionários para áreas estratégicas da Petrobrás. Segundo empresários, a licitação foi montada no começo do ano para legitimar a empresa do senador Eunício Oliveira por meio de um contrato fechado, após a simulação de uma "disputa" com outros concorrentes.

 

O Estadão procurou todas as empresas envolvidas na concorrência. Apenas uma aceitou falar com a reportagem, a Parceria Consultoria Empresarial, uma empresa pequena, que ocupa duas salas num prédio comercial no centro do Rio de Janeiro. A diretora Sônia Gassman afirmou que não sabe de acordo, mas admitiu que sua empresa é pequena para ser convidada a participar de uma licitação desse porte. "A minha participação na Petrobrás é pequena, mixuruca. Nunca sou chamada para essas concorrências."

 

A direção da Seebla diz ter denunciado em maio, à estatal, irregularidades da empresa do senador Eunício de Oliveira, a Manchester, que fraudou concorrência de R$ 300 milhões.

 

A direção da Seebla Engenharia afirmou que a Petrobrás sabe desde o dia 11 de maio do assédio da empresa Manchester Serviços Ltda para fazer um acordo numa licitação de R$ 300 milhões na Bacia de Campos, região de exploração do pré-sal no Rio de Janeiro.

 

Segundo a Seebla, o episódio foi relatado à ouvidoria da Petrobrás. O número de protocolo da denúncia, segundo a empresa, é 03.730. Além da denúncia oficial, a empresa também diz que relatou o episódio ao gerente executivo da Petrobrás, José Antonio Figueiredo.

 

O Estadão revelou que a Manchester, com o intuito de fraudar a licitação, soube com antecedência da relação de concorrentes. O contrato de R$ 300 milhões deve substituir os serviços emergenciais que já renderam R$ 57 milhões sem licitação para a empresa do senador Eunício Oliveira. De posse dos nomes dos concorrentes, a Manchester procurou empresas para fazer acordo e ganhar o contrato. Uma das visitadas pela direção da Manchester foi a própria Seebla, conforme mostram os registros do prédio dessa empresa em São Paulo.

 

O diretor da ouvidoria da Seebla, Milton Rodrigues Júnior, disse ontem que relatou à Petrobrás "chantagem" e "ameaça de retaliação" pela Manchester antes da licitação, ocorrida no dia 31 de março. O relato ocorreu em 11 de maio, 12 dias depois de a comissão de licitação declarar a proposta da Manchester em primeiro lugar com um valor R$ 64 milhões a mais do que a oferta da Seebla.

 

Através de comunicado, o senador Eunício Oliveira disse que está, desde 1988, "afastado da gestão de todas as empresas" das quais é acionista, "inclusive a Manchester, como pode ser verificado nas juntas comerciais". "Não acompanho e não interfiro em quaisquer decisões", acrescentou o senador no comunicado.

 

No comunicado, Eunício Oliveira afirma também que desconhece "os personagens das empresas concorrentes citadas e desafia "que alguém apresente prova" de interferência dele em concorrências públicas e conclui: "Buscarei na Justiça a reparação de danos causados à minha imagem".

 

Em outra carta-resposta, a Petrobrás "rechaça com veemência as insinuações de favorecimento". A estatal destaca que 10 companhias foram convidadas para a licitação, além de prestadores de serviços. Sete apresentaram propostas - e a operação foi realizada por meio eletrônico.

 

A Seebla, segundo a nota, tinha menor preço, mas sua proposta tinha inconsistências, como alíquota do ISS menor que a praticada em Macaé e omissão dos percentuais de encargos sociais exigidos. "A proposta desclassificada não seria exequível mesmo que a empresa operasse com taxa de administração e lucro zero", diz a estatal.

 

ANTONIO CARLOS LACERDA é correspondente internacional do PRAVDA.RU. E-mail:- [email protected]

Subscrever Pravda Telegram channel, Facebook, Twitter

Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
X