Crises: A crise grega

A crise grega, que se pressente que ainda demorará a acabar, pode, como uma de suas consequências, ter exposto a real natureza da Eurozona e ter levado ao primeiro plano o debate sobre o próprio euro.


Diktat para nada

Já é suficientemente claro que o 'acordo' extorquido da Grécia quando da reunião do Eurogrupo e do Conselho Europeu na fatídica noite de 12-13 de julho nada conseguiu. Não só o chamado 'acordo' revela-se a cada instante mais inadequado e incapaz de tratar a fundo o problema, como se vai percebendo também que não trará qualquer alívio. Os bancos gregos vão reabrir as portas na próxima 2ª-feira, 20 de julho, mas só para operações extremamente limitadas. As retiradas semanais da população não poderão exceder 420 euros por semana, mesmo que num único saque. As operações bancárias para empresas gregas continuarão muito limitadas. De fato, essa situação de penúria de liquidez que foi organizada pelo Banco Central Europeu é golpe fatal contra a economia grega. A porcentagem de empréstimos ditos "de cobrança duvidosa" [fr. non-performants] aumentou muito depois de 26 de junho passado. As necessidades em financiamento dos bancos gregos passaram de 7-10 bilhões de euros ao final de junho, para 25-28 bilhões dia 15 de julho e podem chegar a 35 bilhões à altura de meados da próxima semana. 

O sistema bancário grego foi deliberadamente destruído pelas pressões exercidas pelo Banco Central Europeu, operação que teve finalidades essencialmente políticas. Os montantes de que a Grécia precisará simplesmente para impedir o caos total, se tiver de permanecer na Eurozona, não são pois 82-86 bilhões de euros, como estimados dia 13 de julho, mas, mais provavelmente, da ordem de 120 bilhões de euros. A dívida da Grécia não é hoje absolutamente "sustentável", e o 'acordo' nada fez para garantir-lhe sustentabilidade. Se Mme. Merkel, M. J-C Juncker e M.Dijsselbloem entendem que 'derrotaram' Alexis Tsipras, eles bem rapidamente aprenderão o significado da expressão "vitória de Pirro".

O custo político dessa crise 

Mas o mais alto custo disso tudo não será econômico. Ele já é, na realidade, político. Cada vez são mais numerosas as vozes que o dizem. De fato, as condições nas quais os termos desse perfeito diktat foram impostos já detonaram a pretensão da União Europeia de ser [ou de ser vista como] espaço de cooperação e de solidariedade, sem conflito algum. A Eurozona revela-se como nada além de um instrumento de dominação desejado pela Alemanha com a aquiescência da França. 

Muito rapidamente a Alemanha compreenderá o que lhe custará, em preço político, essa aparente vitória. Em apenas poucos dias, a Alemanha fez sumir todo o capital de simpatia relativa e, seja como for, de respeitabilidade, que demorou várias décadas para acumular.

É portanto muito provável que venhamos a assistir a uma agudização dos conflitos, seja dentro do Eurogrupo (a Eurozona) seja também dentro da União Europeia. É claro que os governantes alemães estão hoje diante da seguinte alternativa: ou aceitam que a Eurozona seja convertida em União de passagem, o que sempre recusaram desde 1999 - e que, de um ponto de vista estritamente contábil, não podem aceitar - ou organizam a saída da Grécia, da Eurozona, mas sob condições que trarão, muito rapidamente, a implosão de toda a mesma Eurozona. 

Eis por que estão tentando tão desesperadamente encontrar uma terceira via, a instauração de um sistema de duas moedas na Grécia, para fingir que o país ainda integraria a Eurozona, nominalmente. Mas o sistema bimonetário revela-se extremamente instável, em casos em que o país já não controle o próprio Banco Central.

O debate sobre a viabilidade do euro 

Além disso, sejam quais forem as diferentes tentativas para resolver essa crise grega, é claro que a crise abre, de modo particularmente violento, o debate sobre a viabilidade do euro. É muito significativo que um antigo economista-chefe do Banco Central Europeu já tenha exposto abertamente esse problema. Também nesse item, muitas vozes já se somam à dele. É portanto claro que esse debate, longamente suprimido e reprimido, está afinal eclodindo. Os argumentos de autoridade que estão aparecendo, sobretudo na França, já não convencerão ninguém. 

A abertura de um verdadeiro debate sobre os custos econômicos e políticos do euro é sinal evidente da decomposição do euro. 

Claro que ainda há muitos importantes fatores a bloquear esse debate, dentre outros motivos, porque ele põe em discussão a legitimidade de grande parte da classe política na França. Mas essa classe política já não conseguirá doravante impor seu veto ao próprio debate; e deve esperar por uma subida no tom das críticas que enfrentará nas próximas semanas. É o começo do fim. Ninguém desejaria poder ignorar esse debate, mais que o presidente M. François Hollande, da França. *****

18/7/2015, Jacques Sapir, Russeurope, "Hypotheses"

http://russeurope.hypotheses.org/4124

 

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Author`s name Timothy Bancroft-Hinchey
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